Quem cuida do trabalho de reprodução da vida?

Encontrei esse desabafo por aí, na rede.  Mulheres trabalham em média 24 horas em trabalhos domésticos não remunerados (limpar a casa, cuidar de criança e das mais velhas ou mais velhos). Os homens declaram gastar um pouco mais de 9 horas nas mesmas funções. As mulheres tem rendimento 30% menos que dos homens e somos poucas no Poder Legislativo, em torno de 10%.  Quem trabalha pela reprodução da sua vida?

Mulheres em Movimento Contra a Carestia (Achei no Blog do Nassif, mas não sei quem é o artista nem em que arquivo está, se alguém souber, favor mandar os créditos)

Mulheres e Homens deveriam ser iguais, mas são diferentes quando o assunto são os filhos

Não tem como negar, todo mundo é “filho da mãe”, mas o LAZARENTO É O PAI. Não quero dizer aqui que são “filhos da puta” porque puta pra mim é gente de muito valor. Com o fim dos relacionamentos dos casais é comum que o cuidado dos filhos fique sob a responsabilidade das mulheres. Descartando a idéia de “aborto social dos pais”, mulheres seguem lutando para educar e prover sua família e seus filhos sozinha. Digo SOZINHAS, porque o estado não provém as políticas publicas necessárias para amparar em sua plenitude o direito de nossos filhos, é sempre uma luta para conseguir a vaga na creche, ter uma escola de qualidade, o que fazer com os filhos das mulheres trabalhadoras no contra turno escolar ficam em nossas casas, sozinhos ou ainda, sob a supervisão de vizinhas, por que as periferias carecem de políticas de toda ordem…. Esporte, cultura e lazer…. Falaremos também da questão de classe social, as mulheres mais pobres, são sempre as mais prejudicadas, não recebem pensão alimentícia, e quando recebem esse valor não chega a R$ 200,00, o cara que paga ainda acha que é muito dinheiro e fica querendo saber: – O que você faz com a pensão que eu te dou? Só faltou completar a frase: – “Gastou no motel”?

Eles pensam: – Toda mãe solteira é puta!

Parece que agente compra lingerie com o maldito dinheiro e nem sabe que nossas calcinhas estão todas rasgadas porque não temos dinheiro nem pra comprar qualquer coisa que não seja de uso e necessidade básica.

ENTÃO SOMOS TODAS PUTAS E ELES NÃO SABEM QUANTO CUSTA EDUCAR, CUIDAR, ZELAR POR UM FILHO.

Os filhos de mães solteiras consomem mais de 80% de sua renda, não são apenas as garantias do mínimo: roupa, sapato, alimentação, moradia, água, luz, que se gasta dinheiro hoje em dia, nossos filhos querem acesso à internet, celular… e esta é uma lista que sempre cresce todos os dias.

Eu sempre falo para o meu filho: – De cada dez palavras que você me fala, nove é pedindo para eu comprar algo. Outro dia ele disse:

– Mãe compra um tablet? Eu disse: – não tenho dinheiro, logo em seguida ele disse: – Mãe compra um IPOD, eu disse, não tenho dinheiro. Ai a próxima foi: – Mãe, porque você não compra um camaro amarelo.

Naquela hora, eu pensei como mãe solteira que tenho de pagar todas as contas da casa e garantir a você todas as necessidades básicas de alimentação, moradia, vestuário…. e por isso não compro mais nada, nada mesmo, nem uma calcinha nova, então pensei que há quase dois anos, vivo com as mesmas duas calças Jens no guarda roupa e já tive que trocar seu guarda-roupa 3 vezes nos últimos seis meses porque você esta em fase de crescimento e perde tudo tão rápido. Hora é o pé que não pára de crescer, é a roupa que ta curta e apertada, é a meia, a cueca, o gibi, a figurinha, o joguinho, É POR ISSO QUE EU NÃO TENHO UM CAMARO AMARELO, QUE NÃO TENHO CARRO NENHUM, E TENHO QUE O TEMPO TODO DIZER PRA VOCE QUE NÃO TENHO DINHEIRO AFINAL EU NEM TENHO UMA VIDA MAIS. Tudo que faço é acordar de madrugada, organizar para você ir a escola, limpar a casa antes de sair para o trabalho, trabalhar, trabalhar como uma vaca, para no fim do mês, ver todo meu salário sumir em 5 dias e pagar todas as contas sozinhas porque decidi ser mãe solteira. Quando chego do trabalho corro fazer o jantar, organizar o banho, fazer a lição de casa, colocar a roupa na maquina, uffa! Eu tenho uma maquina! Mais ainda falta Lavar a louça, passar a roupa…. as vezes me vejo andando pela casa perdida … porque são tantas coisas para fazer que tem dia que nem quero começar, antes de acabar a noite ainda sentamos para contar historia, ler um livro, afinal, você precisa incentivar seu filho ler, para que ele seja uma pessoa bem sucedida no futuro, ele tem que ser bom aluno, todo fracasso escolar de seu filho será responsabilidade sua (MAE SOLTEIRA), porque o pai…. ahhhhh!!!! esse ninguém nunca lembra onde está. Muitas mulheres casadas ainda não perceberam que TAMBEM são mães solteiras!!! Na verdade eu não decidi ser mãe solteira. O ser proprietário do espermatozóide acha que a vida de pai começa e termina ali, depois da gozada e nós mulheres é que ficamos sem dormir pelo resto da vida. Naturalmente os homens são caracterizados pela sociedade por completa incapacidade de cuidar dos filhos, por isso a maior parte das decisões judiciais são favoráveis que os filhos fiquem sobre a guarda das mães. Pergunto-me: Quais são as reais condições paternas que protegem os homens de assumir a responsabilidade com os cuidados de seus filhos? Quais são as reais punições àqueles que não cumprem com seu devido direito? Porque as mulheres são punidas por não acatarem a um casamento infeliz para o resto de suas vidas? Para que um homem assuma a guarda legal do filho é necessário que se prove a incapacidade da mãe para só depois permitir que o pai tenha a guarda legal do filho na justiça, as condições paternas só são levadas em consideração caso as condições maternas sejam desfavoráveis, refletindo a estrutura da sociedade patriarcal a cerca da matéria em pauta. Chegam dizer a todo o momento que as crianças ficam melhores em companhia da mulher porque “mãe é mãe”. Isso reforça a idéia de que vivemos em uma estrutura desigual entre homens e mulheres. A Supremacia da maternidade gerenciada por décadas reforça os estereótipos do “ser mulher”, isso contraria o principio constitucional da igualdade de homens e mulheres, pai e mãe, e da lógica pressuposta no estatuto da criança e do adolescente que transcende as relações de gênero e afirma o direito à proteção integral assegurando-lhes as faculdades de seu desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade. Ainda que, a lei trate como igual o direito do pai e da mãe em exercer o poder familiar, ainda que todas as leis reafirmem que homens e mulheres são iguais em direitos e deveres, ainda que as leis enfatizem que é dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder publico assegurar com absoluta prioridade a efetivação dos direitos de nossas crianças e adolescentes agora substitua a “família, comunidade, sociedade e poder publico” por “ mãe solteira”, “mulheres” e veja o tamanho de tudo que somos atribuídas a cuidar na ausência da família, da comunidade, sociedade e principalmente poder publico. Reestruturemos a sociedade para que as mulheres sejam realmente livres, obriguemos o estado a reduzir nossa jornada de trabalho, salários dignos, escolas de qualidade, políticas de lazer para as mulheres e a responsabilização dos homens que não cuidam de seus filhos. Com a Constituição Federal de 1988, a filiação passou, então, a ser regida pela prioridade absoluta à pessoa do filho, com igualdade entre o pai e a mãe. Na verdade, a justiça desse país tramita com base nos novos valores constitucionais e traz o instituto da guarda compartilhada, alem de determinar que a guarda monoparental fosse atribuída a quem tivesse melhores condições de criar a criança e o adolescente: NESTE CASO ÀS MULHERES, exploradas pelos baixos salários no mercado de trabalho, serviçal do trabalho domestico e cultural, realidade prática que demonstra a prevalência da guarda monoparental materna, impondo a investigação dos parâmetros sociais e culturais que, de algum modo, repercutem na atualidade. Exercer a guarda de um filho equivale a dar-lhe educação, carinho, afeto, respeito, atenção, sustento, alimentação, moradia, roupas, lazer, recursos médicos e terapêuticos; significa acolher em casa, sob vigilância e amparo; significa instruir, dirigir, moralizar, aconselhar; significa propiciar-lhe uma vida digna. A supremacia materna cultural presumida criminaliza as mulheres que defendem a igualdade no exercício da maternidade x paternidade. A divisão sexual do trabalho impõe à mulher a condição de desempenhar funções exclusivas na sociedade do universo feminino, portanto, estão sujeitadas a mendigar pagamento de pensão alimentícia ao genitor pela falta de capacidade do homem em atribuir as tarefas do cotidiano em sua rotina. Me poupe! Na verdade, o trabalho doméstico, não é reconhecido pelo sistema capitalista como um produto de exploração do universo feminino e sim como um dom natural das mulheres. Nega a estrutura patriarcal que se forma a sociedade sexista, num reconhecimento implícito da falta de capacidade do homem, quando na verdade é a zona de conforto para que a vida dos homens seja regado de bem estar e mordomias, claro que pagas com a mão de obra gratuita oferecida pelas mulheres. Se homens e mulheres são iguais em direitos, nós queremos: -redução da jornada de trabalho; -restaurantes populares; seria ótimo não ter que cozinhar todos os dias -Lavanderias populares; seria ótimo não ter que passar horas e horas lavando e passando – creches noturnas; seria ótimo marcar um cinema e ter com quem deixar seu filho; – escolas em período integral, laica, gratuita e de qualidade; assim íamos parar de ficar pedindo favores aos vizinhos e parentes que adoram jogar na sua cara os favores realizados.

E por fim, gostaria que as mulheres, mães solteiras tivessem a coragem de desabafar a pressão desta sociedade machista e de verdade parar de se culpar por não conseguir fazer tudo que deseja. E assim entregar aos pais solteiros a guarda de seus filhos para que a sociedade pare de dizer que somos mais capazes que os homens e sim, que somos iguais em direitos. Portanto ambos temos condições igualitárias no desenvolvimento da maternidade x paternidade de nossos filhos.

PARA NÃO DIZER QUE NÃO FALEI DAS FLORES

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Como forma de sistematização do meu ponto de vista sobre as manifestações populares que tomaram as ruas das grandes cidades do Brasil ontem, seguem alguns comentários.

1 – Sim, sou a favor dos movimentos populares e acho que 250 mil pessoas na rua devem nos alertar para uma série de questões importantes, de insatisfações significativas. Sim, a Democracia também se faz na rua, com manifestações. Muitas pessoas me escreveram pedindo para que eu fosse à rua, numa espécie de “pare de fazer política de facebook”. Bem que eu gostaria, mas estando em Uberlândia, onde reinava o silêncio, ficava bem difícil chegar às grandes capitais, como São Paulo, que era onde gostaria de estar (por uma série de razões). No entanto, o próprio movimento Passe Livre também nasceu na internet e ela deve ser sim considerada como um espaço legítimo de atuação política.

2 – Ainda é muito cedo para falar de todos os significados que os movimentos que aconteceram ontem comportam. Mas o que me parece certo é que se tratou de uma mobilização bastante plural, cheia das mais diversas expectativas. Isto é, adianta pouquíssimo dizer que o movimento é um só. Ele é complexo, alvo das mais diferentes disputas políticas e, a meu ver, devemos estar atentos a isso, pois caso contrário perderemos o “bonde” da história. Assim como outros movimentos populares, alguns citados ao longo da semana passada, tais como a Revolta do Vintém e a Revolta da Vacina, a tomada das ruas pela população ontem carrega sentidos em seu âmago que serão disputados à unha pelos mais diferentes grupos políticos. Lá estão pessoas insatisfeitas com o transporte público das grandes cidades, insatisfeitas com a violência policial, com governos autoritários como o de Alckmin, que reprime manifestações populares, com as condições da saúde e da educação (em SP o caso é gritante, pois foram décadas de descaso por parte dos governos de Direita), enfim, todas reivindicações muitos justas e importantes a meu ver. Palmas para o movimento, palmas para a DEMOCRACIA. Concordo que lá existiam movimentos importantes da juventude, querendo indagar sobre como atuar politicamente, querendo conquistar seu protagonismo histórico, querendo o cumprimento de antigas promessas não cumpridas por vários e vários governos que passaram por cidades como São Paulo.

3 – Entretanto, os movimentos também foram palco da mais aguerrida luta de classes, no meu ponto de vista. Pois, ao movimento do Passe Livre também acabaram se somando as forças mais reacionárias do Brasil contemporâneo. Lá estava uma classe média que, a despeito do conforto e das vantagens que vêm tirando desses dez anos de crescimento econômico, gritava contra o bolsa família (chamado por eles carinhosamente de “bolsa esmola”), lá estavam os que gritavam contra o mensalão (que ainda está por se provar e incita os questionamentos mais sérios sobre a perigosa atuação golpista do STF), os que reclamam que tem pobres demais nos aeroportos, os que vaiam a COPA, mas que vão aos jogos, lindos, com seus ingressos de R$ 400,00. Lá estavam também os que se mostraram indignados com a PEC das domésticas, os que chamaram o movimento de BADERNA na última terça-feira (pois este impedia o trânsito na faceira Avenida Paulista), e também, como não podia faltar, os que chamam o governo do PT de comunista. Tinha de tudo. E todos tem o direito de se manifestar. Mas é preciso pensar nessas forças que estão se articulando, gostemos ou não dessa realidade. É preciso pensar na complexidade que as 250 mil pessoas reunidas sem uma bandeira única, sem uma organização mais centralizada de reivindicações (ninguém pode negar que esse é o aspecto geral da manifestação), representa. A Direita está atenta e nós também devemos ficar. Olhar os movimentos de forma acrítica, idealizada, só servirá para obliterar possíveis “marchas da família” (ou seus equivalentes contemporâneos), que lá também parecem estar e que são perigosíssimos para a Democracia.

4 – Algo que chamou muito a minha atenção foi a tentativa de destruição de símbolos da democracia, acompanhada de um discurso que vem sendo repetido levianamente pela Direita de que político é tudo igual e que não vale nada. Por que ameaçar a Assembleia Legislativa ou a sede da Polícia Federal, ou ainda o próprio Congresso Nacional?  O discurso do “nada presta” só leva a Direita ao poder.  Tudo isso com a mídia desprezando nossa Democracia, chamando-a de jovem, quase dizendo que não estamos preparados ainda para vivê-la. Nós nos esforçamos demais para alcançar a democracia e esse discurso sempre favoreceu golpes totalitários na história. A negação da política é extremamente perigosa, os totalitarismos que nasceram na Europa no começo do século XX devem nos servir de alerta.

5 – Para quem assistia à distância, como eu, ficou claro tanto ontem como hoje, a busca por parte da grande mídia de se apropriar dos movimentos, de uma forma golpista, perigosa. A mídia estava lá, festejando a ocupação dos símbolos do poder, incentivando a tomada do poder pela força já que, não consegue pelas eleições democraticamente realizadas. Me lembrou o Paraguai, o golpe. E o eco chegou rápido às redes sociais, que passaram a pedir o impedimento da presidenta, democraticamente eleita pela MAIORIA DA NAÇÃO. Olhando a cobertura dessa mesma mídia hoje, incluindo aí não apenas os grandes jornais e as redes de televisão, mas também os meios de comunicação locais, como os de Uberlândia, observamos um coro uníssono de um mesmo editorial que empresta aos movimentos suas bandeiras da Direita (o combate genérico à corrupção, a diminuição dos impostos, a Copa, a crítica contra a PEC 37, etc.). De forma perniciosa, essa mesma mídia incita a confusão das funções dos diversos entes federativos (municipal, estadual e federal), a fim de poupar seus aliados e jogar cobranças indevidas em seus opositores.

6 – Também me assustam as palavras de ordem: “sem partido” e “sem bandeira”, repetidas nas manifestações de diversas cidades. Mentira e das perigosas. Todo mundo tem um lado, todo mundo tem um lugar social e político a partir do qual está falando. Fico com a impressão que tinha de tudo no movimento: PSOL, PSTU, PT, PSDB e tantos outros. Estavam lá, todos brigando pelo seu quinhão na disputa pelos sentidos. Para mim, a bandeira do movimento não tinha que ser branca, mas VERMELHA, pois nasceu de um grupo que ontem mesmo no Roda Viva se intitulou como uma força de ESQUERDA. Dizer que a bandeira é branca significa despolitizar a mobilização e isso é muito perigoso, pois abre brechas para a apropriação descarada que está sendo feita pela Direita e pela mídia.

Enfim, como todos, ainda estou esperando pelos resultados positivos dessas disputas e tentando dar a minha contribuição. Mas vou continuar em alerta, pois muita coisa pode acontecer: para o bem e para o mal. Deposito todas as minhas esperanças, no caso do movimento Passe Livre em São Paulo, em uma ação justa tanto diante do governo Municipal (do PT) como perante o governo Estadual (do PSDB). Se Haddad ceder, mas Alckmin não, quero ver o movimento continuar pressionando, parando a cidade, à espera de uma negociação com o governador (que já disse, ao contrário de Haddad, que não haverá conversa). Digo isto, porque São Paulo também anda de metrô e trem, que também são caríssimos. Se isso não acontecer, aí já serão outras águas…

Ana Flavia Cernic Ramos

Uma vitória das domésticas e da classe trabalhadora

Nessa última terça-feira o Brasil deu um passo memorável quanto ao reconhecimento de que as trabalhadoras e trabalhadores domésticos têm os mesmos direitos e são iguais a quaisquer outros trabalhadores do país, beneficiando mais de 6,6 milhões de pessoas. Esse número não é pouca coisa, pelo contrário, corresponde a quase o dobro da população do Uruguai, é quase igual á população do Paraguai e pouco abaixo da população da Suíça.

Votação do primeiro turno da PEC das Domésticas na Câmara (Acervo de Erika Kokai)

Votação do primeiro turno da PEC das Domésticas na Câmara (Acervo de Erika Kokai)

Para a Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República – SPM, a aprovação, por unanimidade, da conhecida como “PEC das Domésticas” em segundo turno do Senado foi uma demonstração de que a sociedade brasileira amadureceu na compreensão de que, por uma questão de justiça social, era necessário equiparar os direitos das trabalhadoras domésticas ao restante das e dos trabalhadores.

A Constituição Federal, em seu art. 7º, arrola os direitos dos trabalhadores urbanos e rurais brasileiros, porém, grande parte desses direitos não englobaram as trabalhadoras domésticas. Com a aprovação da Emenda Constitucional, a categoria passa a ter 17 direitos a mais, como o salário família, o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço obrigatório, o seguro-desemprego, a garantia de salário-mínimo, a jornada de trabalho de 44 horas semanais, o pagamento de adicional por hora extra, entre outros.

Para a SPM, essa conquista vai além dos ganhos concretos e tem também um significado importante para a ampliação da autonomia econômica das mulheres, principalmente considerando que elas são hoje as principais responsáveis em 37,4% das famílias brasileiras e, na metade delas, estão sozinhas, sem um companheiro. Nessa situação se encaixam, seguramente, um grande número de empregadas domésticas.

Como em todos os momentos em que se aprova algo novo, as incertezas quanto aos impactos da nova lei podem causar um certo desconforto inicial, porém, a grande maioria das pessoas do país reconhece o valor e a justeza dessa aprovação. A nova legislação, que será promulgada pelo Congresso e entrará em vigor na próxima terça-feira, dia 2 de abril, denota um avanço importante nos direitos conquistados com a Constituição de 1988 e é motivo de orgulho para todos e todas aquelas que almejam a consolidação da democracia e buscam um Brasil justo e igualitário.

O ardiloso flerte da Folha e Joaquim Barbosa

A Folha faz, de maneira mais “sofisticada”, o que a Veja e a Época fizeram com Joaquim Barbosa neste final de semana, isto é, o transforma em herói, mesmo chamando-o de anti-herói. Folha é perspicaz. Em seu artigo, mostra Barbosa como eleitor de Lula e Dilma, jurista devotado, imparcial, coerente na sua atuação no STF, de origem pobre, sério, tentando desmontar as críticas de que o que está ocorrendo no STF é um julgamento “político”, de “exceção”. Afinal, não se trata de um magistrado identificado com a Direita que está condenando, mas um eleitor do Lula. Enfim, Mônica Bergamo, de forma sutil, ratifica a imagem de herói do Brasil. Ardiloso, muito ardiloso, o texto do jornalão. Entretanto, joga para baixo do tapete todas as incongruências e contradições do honorável ministro para reforçar uma imagem positiva. Entre os “calcanhares de Aquiles” escamoteados de Joaquim Barbosa estão:

 1 – Como relator do “mensalão do PSDB”, Barbosa não demonstrou o mesmo empenho ou pressa para que o este fosse julgado, embora ele tenha ocorrido antes do suposto “mensalão do PT” e com sério risco de prescrever. Como homem que defende o “bem público”, como ele mesmo disse, isso não é preocupante?

 2 – Como representante do STF no Ministério Público, durante as investigações do “mensalão do PT”, Barbosa não parece ter se incomodado com o fato de que os indícios que apontavam para o envolvimento de grandes empresários terem sido claramente deixados de lado.

 3 – Barbosa critica a própria mídia, mas está lá, no dia da eleição, posando para foto e narrando sua trajetória de vida. Diz que não comentará a AP470, mas sabe que aquela reportagem servirá para legitimar sua atuação nesse julgamento. Apesar de negar, todos sabem que a reportagem é sim sobre o julgamento de “mensalão” em curso. Barbosa critica a mídia, mas fala para ela durante as sessões. Por vezes, sua retórica parece ser moldada exatamente para o sensacionalismo midiático feito sobre o caso. Comentários irônicos – e mesmo depreciativos do PT – aparecem intercalados com a leitura de seus votos. Sua “performance midiática” tem corroborado sim na construção de sua imagem de “herói” e ajudado muito a Direita.

 4 – Barbosa, que na reportagem se mostra de forma tão “neutra” (julga e relata casos tanto de petistas quando tucanos), não se opôs à realização do julgamento (feito às pressas) na véspera do período eleitoral (com a análise do núcleo político do PT “coincidindo”, com a mesma precisão de um relógio suíço, na semana de eleição). Afinal, para um defensor da “coisa pública”, “independência dos poderes” e isenção do judiciário, não seria mais adequado que o julgamento ocorresse em outra época, menos turbulenta e cheia de apropriações oportunistas por parte da mídia e da oposição?

Ninguém duvida dos méritos da trajetória pessoal de Joaquim Barbosa, mas não dá para acreditar que ele está fora de todo o jogo político-partidário que se armou em torno do julgamento do “mensalão”.

Ana Flávia C. Ramos

Sobre o aperto de mão entre Lula e Maluf

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“Vamos examinar as realizações do governo Lula e ver se o sistema político que forçou essas alianças impediu as coisas essenciais do governo Lula. Não impediu. Você tem 18 milhões que saíram da linha da miséria, 32 milhões que saíram da linha da pobreza, 40 milhões de empregos novos com elevação salarial. Você tem 73 Conferências Nacionais com 70 mil pessoas participando para decidir sobre todos” (Marilena Chauí, em entrevista à Caros Amigos de 2011)

Seguem alguns comentários a respeito da aliança PT-PP em São Paulo: 1) É curioso perceber que até agora o PP do Maluf esteve na base de apoio ao Kassab e ao Alckmin (inclusive ocupando cargos nos dois governos) e ninguém criticava ou reprovava tal aliança. Agora que o PP fechou com o Haddad, então, o Maluf foi redescoberto, ou melhor, o mau caratismo do Maluf (quanto a isso não existe dúvida alguma) voltou com toda a força à mídia. E tal fato (a volta do Maluf e suas patifarias) nas manchetes da imprensa favorece um lado muito claramente na disputa eleitoral. É preciso, portanto, tomar cuidado nas análises para não ser pautado pelas escolhas da grande imprensa. 2) Partidos como o do Maluf e todos os demais de pequeno ou médio porte não têm um programa político definido (exceção são os de extrema esquerda), justamente para poderem estar sempre ao lado do governo (ao fundar o PSD, uma típica agremiação de médio porte, Kassab disse que se tratava de um partido com “vocação governista”). Um dos instrumentos fundamentais para a sobrevivência desses partidos é justamente o voto personificado (“na pessoa”) em detrimento do voto em um partido (ou programa). Eles têm horror a qualquer reforma política que se aproxime de um modelo parlamentarista, em que o fundamento seja o voto em um partido e não em pessoas. Não é à toa que esses partidos de pequeno e médio porte vivem atraindo famosos (do mundo do esporte, da música, artes, etc) para suas legendas, pois assim conseguem um número estrondoso de votos e ainda escamoteiam a falta de programa (o PMDB é o único dos grandes partidos que também não apresenta um programa partidário muito definido, com a finalidade de estar sempre no poder) 3) O PT tem uma postura muito clara de alianças dentro do atual espectro político, qual seja, oposição ao PSDB/DEM (que possuem um programa vinculado ao neoliberalismo) e a outras legendas pequenas de extrema direita, associada com uma busca por alianças com os demais partidos (seja o PMDB, PP, PR, etc). Aliás, essa é a estratégia do próprio PSDB/DEM, só que com os polos invertidos (oposição ao PT e legendas de extrema esquerda e busca de alianças com os demais). Também não me agrada o PP de Maluf (e todos os demais partidos que não tem programa político definido), mas sem eles dificilmente se ganha eleição ou consegue se governar. Assim, é um cinismo da imprensa criticar a estratégia de alianças do PT e poupar a outros grandes partidos como o PSDB/DEM/PMDB. Ou melhor, não é cinismo só revela sua posição dentro do jogo político eleitoral. Enquanto não for feita uma reforma política séria, o sistema de alianças vai continuar sendo uma necessidade. 4) O nosso atual sistema político-eleitoral foi construído durante a ditadura militar e é moldado de forma a preservar o status quo, o que significa que ele funciona para deixar de fora qualquer programa que pretenda transformações sociais, econômicas e políticas. Vejo a atuação do PT como resultado de uma estratégia que visa ocupar os espaços políticos existentes no Brasil e a partir daí tentar fazer a diferença. Essa é a ideia! É importante chegar ao poder e construir um governo (mesmo com todas as amarras do jogo político) que traga transformações e melhoria na qualidade de vida para a população. E, em minha opinião, o PT tem conseguido produzir enormes avanços para o país (talvez nem tanto como esperávamos ou não no ritmo que queríamos), mas as diferenças com governos PSDB/DEM, por exemplo, são brutais. Não dá para ficar de fora do jogo esperando uma revolução acontecer, tem que construir as condições para as mudanças, tem que ocupar os espaços e tentar minar ao máximo o sistema perverso de exclusão que vivemos.

Ricardo Pirola